quinta-feira, 27 de agosto de 2015

Mitologia Nórdica, 3- A vida após a morte, O caminho dos enfermos, velhos, acidentados, etc:

A deusa dos mortos era Hel ou Hela, a qual era filha de Loki e da giganta Angrboda. Hel era irmã do lobo gigante Fenrir e da gigantesca serpente Jormungand. Ambos os monstros também eram filhos de Loki com Angrboda. Hel era descrita segundo Snorri, como tendo metade do corpo de aparência normal, mas a outra metade tinha a aparência cadavérica. Em outras fontes mitológicas não encontramos menções a aparência da deusa. 

"[Allfödr] lançou Hel ao Niflheim, e a ela concedeu autoridade sobre os nove mundos e responsabilidade por aqueles que lhe fossem enviados, vitimados por doença ou por velhice. Lá ela possui uma grandiosa morada, com altas muralhas e poderosos portais. Seu palácio chama-se Éljúdnir; seu prato, Hungr; sua faca, Sultr; seu servo, Ganglati; sua serva, Ganglöt; Fallanda se encontra ao portal [de Éljúdnir]; Kör é sua cama e Bilkjanda é o cortinado de seu leito". (STURLUSON, 1993, p. 84). 


O palácio que Hel habitava, ficava na região chamada Helheim ou Helgardh, o qual ficava localizado em Nilfheim como apontado, logo a ideia de ser um lugar quente como se tem a ideia de Inferno, é problemática neste contexto. A terra de fogo era Musphelheim, neste caso Nilfheim era uma terra congelada e de neblinas. Nas breves descrições sobre Helheim não há menções a rios de fogo, fumaça e lava, mas apenas a escuridão, frio, névoa, etc. Sendo assim, Helheim seria na realidade um "inferno congelante". Contudo o nome da deusa Hel originou a palavra hell que em língua inglesa significa inferno. 

Embora os cristãos tenham adotado Hel como tradução de infernus, no entanto, é preciso esclarecer que ambos os locais são bem diferentes. Primeiro, Hel era uma terra sombria e fria, e não quente e fumacenta como o Inferno. Segundo, o mais importante: é que Hel não seria um local de tormentos como alguns imaginam. 

Alguns poemas escaldos como o Sonatorrek (Meus filhos mortos) e nos poemas da Edda poética como o Völuspá (Visões da advinha), Baldrs draumar (Os Sonhos de Balder), Grímnísmal (Os ditos de Grímnir), Vaftrúdnismal (Os ditos de Vaftrúdnir) Alvísmal (Os ditos de Alvis) e o Skírnismal (Os ditos de Skírnir) fazem menção a Helheim, entretanto, não se diz por quais motivos as pessoas iriam para aquele local. 

Na Edda em prosa, Snorri Sturluson nos fornece uma pista para compreender por qual motivo as almas iriam para Hel. Segundo sua versão, que não sabemos se ele inventou ou copilou de alguma tradição hoje desconhecida, informa que as pessoas que morriam de doença e velhice, iriam para Helheim.

Na óptica desses motivos dados por Snorri, morrer de doença, significaria fraqueza; já morrer de velhice, no caso de um guerreiro, significaria covardia, pois um guerreiro independente da idade, deveria morrer com glória no campo de batalha. 

Por outro lado, Snorri também informa em seu livro que quando o deus Balder foi assassinado por Hodr, devido a um plano escabroso de Loki, a alma do deus foi enviada para Hel. A esposa de Balder, Nanna, em pranto pela morte do marido, se jogou na pira fúnebre dele, para segui-lo em Hel. A morte do deus é mencionada no Völuspá, poema que antecede a Edda em prosa em mais de duzentos anos, mas em seu versos não informa para onde a alma de Balder foi, logo, resta-nos duas hipóteses: Snorri inventou essa parte da história ou tomou conhecimento de algum relato hoje desconhecido, pois os mitos eram transmitidos oralmente.


Mas de qualquer forma, o fato de Balder e Nanna terem ido para Hel, mas sem ser pelos motivos de doença e velhice, mas sim de assassinato e suicídio, põe em dúvida a explicação dada pelo autor. Abram (2003, p. 10) e Davidson (1968, p. 84) assinalaram que a ideia de velhice e doença provavelmente seja uma invenção de Snorri, como forma de conceder uma resposta a pergunta de qual seria o motivo para ir-se a Hel, assim como, seja também parte da reelaboração do autor para criar uma dualidade que respaldasse sua visão de Valhala (como o “paraíso”), como sugeriu a própria Davidson (1968, p. 84).

Pelo fato de se desconhecer outras fontes que mencionam os motivos pelos quais as almas iriam para Hel, pode se pensar que Hel teria sido um local comum para a morte? Ou seja, independente de ser homem ou mulher, bom ou mal (a ideia de pecado não existia entre os vikings antes da conversão ao cristianismo), novo ou velho, as almas iriam para Hel. 

No entanto, surge um outro ponto a ser mencionado. Nos relatos que falam sobre Helheim, não lemos nada a respeito de sofrimento, castigos, torturas, etc., algo que estamos familiarizados com a visão das religiões abraâmicas (Judaísmo, Cristianismo e Islamismo) sobre o Inferno. Em Helheim, os mortos jaziam nesse mundo escuro e frio, meio que inertes e deprimidos. No entanto, Snorri disse que Helheim seria um local de "repouso ingrato" para os mortos, mas não um tormento eterno como em outras visões de Inferno. 

De certa forma, poderíamos comparar Helheim com o Érebo no Hades dos gregos; o Érebo era a região infernal onde a maioria dos mortos iam, e lá não era flagelados por castigos e torturas, mas padeciam de lamento e remorso. 


Mas ainda segundo Snorri e os versos 38 e 39 do Völuspá, o verdadeiro local de tormentos não ficaria em Helheim, mas em Nastrond e Nilfhel, dois locais ainda misteriosos para os estudos escandinavos, devido as poucas informações que dispomos sobre eles. Mas em ambos os casos, os maus seria castigados por seus atos em tais locais.

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